Texto de Diego Ortega dos Santos
A imensa maioria das cirurgias da atualidade demanda para o seu sucesso preparo e planejamento. Esses variam de acordo com o procedimento em questão, sendo amparados por critérios diversos. Há, entretanto, alguns princípios básicos indicados para o pré-operatório de qualquer cirurgia.
Primeiramente, é preciso desmentir a aura de obtuso e clinicamente ignorante do cirurgião. Na avaliação do risco operatório, mais do que nunca, dele são cobrados a realização de uma boa história do paciente e um exame geral comparando o estadiamento clínico com o que de fato é observado no momento. Tais medidas evitam situações complicadas e guiam o planejamento cirúrgico. Assim, perguntar por histórias pregressas de distúrbios da coagulação nele ou na família pode evitar hemorragias desagradáveis, por exemplo. Aí também entra a importância considerável de manter relações boas e objetivas com o clínico que encaminhou o paciente, se for o caso. Pode-se, dessa forma, discutir estratégias adequadas ou comparar opiniões. Armado dessas informações, o cirurgião pode estipular o risco operatório, que seria o risco e o benefício relativos do procedimento e do paciente em questão.
Nessa consulta de avaliação também surgem oportunidades de firmar relações com o paciente e de prepará-lo psicologicamente. É imprescindível explicar ao paciente ou ao seu representante legal quando for o caso cada passo da cirurgia, especialmente os detalhes do pré-operatório, tais como sondas, anestesias e entubações, sempre explicando o porquê de cada um deles. Informar dos riscos, tanto da anestesia quanto da cirurgia, assim como alertar sobre desfigurações e mudança de estilo de vida no pós-operatório, é de extrema importância. Sempre que possível demonstrar otimismo, mas permeado de boas doses de realismo. Dessa forma, evitam-se complicações judiciais. E ainda que no Brasil não exista (por enquanto) a cultura do processo jurídico, agir assim é mais humano, ético e seguro.
Boa parte dos pacientes cirúrgicos provêm de doenças crônicas debilitantes, apresentando anemia. Delimitar os níveis mínimos de hemoglobina não é a única tarefa do pré-operatório. É mais relevante determinar os limites seguros de aporte de oxigênio aos tecidos, contemplando também o débito cardíaco e a extração de oxigênio além do nível de hemoglobina. Tendo esses outros dois fatores bem controlados, inclusive, é até possível fazer cirurgias sem níveis de hemoglobinas tradicionais. Entretanto, é absolutamente impossível garantir que não surgirá hipóxia ou perda de sangue no decorrer do procedimento. Todo paciente deve, então, ter uma massa eritrocitária de 10g/100mL, adiando a cirurgia até atingir esse patamar. O déficit de outros líquidos como de plasma e de líquido extracelular são de grande importância também. Exceto em alguns processos patológicos evidentes, níveis baixos desses líquidos podem ser sorrateiros e só se tornarem aparentes no decorrer da cirurgia, exigindo reposições volêmicas inesperadas. Para evitar tal situação, mensurar o débito urinário horário através de cateterismo urinário é útil. O ideal é de 3 litros por dia ou 125mL por hora.
A medida de repor ou suplementar nutrientes é relativamente polêmica. Por ser extremamente cara e não dispor de comprovações contundentes, ela pode até não ser seguida. Há, entretanto, estudos que falam da sua utilidade para evitar infecções e de sua importância em pacientes extremamente debilitados com níveis séricos de albumina abaixo de 2g/100mL. Ademais, é válido salientar que em nenhuma anestesia geral é permitido esquecer-se do esvaziamento do estômago do paciente.
Na avaliação pré-operatória o paciente cirúrgico deve ser afastado de outros pacientes com infecções hospitalares ou comunitárias. A tricotomia deve ser realizada o mais próximo possível da operação, e o sítio cirúrgico deve ser lavado várias vezes com agente anti-sépticos adequados.
fonte: As Bases Biológicas da Prática Cirúrgica Moderna, 15ed, Sabiston et al