Tópicos

< Voltar

Masculino, 34 anos, D. de Chagas Cardíaca - um caso clínic
03/12/2015
Publicado por: Eduardo Inacio Nascimento Andrade

 

 

Introdução

                A doença de chagas é uma patologia de ainda alta prevalência em nosso meio. Segundo A OMS entre 18 e 20 milhões de pessoas ainda são portadoras da doença na America Latina. A Doença Chagástica foi descrita em 1909 e desde então tem se conhecimento considerável sobre a transmissão e fisiopatologia da doença. O Agente causador é o Tripanossoma Cruzi um parasita monoflagelado que apresenta diversas formas evolutivas: tripomastigotas, amastigotas, epimastigotas e esferomastigotas. Apesar de poder ser transmitida por diferentes vetores é o Triatoma infestans (também conhecido como “barbeiro”) o seu principal transmissor na América do Sul. Outras formas de transmissão também são possíveis e se destacam as: Transmissão transfusional, Congênita, por Alimentos, por transplante e por via acidental (manejo de agente em laboratórios).

                De maneira didática as manifestações clínicas da doença de Chagas podem ser subdividias em duas fazes: Agudas e Crônicas. A primeira se da quando da inoculação do parasita o que normalmente ocorre na primeira infância. As manifestações nesse momento são típicos de infecções como febre, astenia, inapetência e cefaleia. Vale lembrar da possibilidade de aparecimento de chagoma na região do corpo em que houve inoculação. Depois de passada a fase aguda o paciente entra na fase crônica que possui a sua etapa assintomática e sintomática. Nessa fase já existe soro conversão para Chagas e o paciente pode permanecer por anos (em geral 3 décadas) assintomáticos. Cerca de 30 por cento desses paciente assintomáticos evoluirão para a fase sintomática. Falando de maneira específica sobre os pacientes sintomáticos cardíacos (caso do paciente relatado nesse artigo), os pacientes em geral se apresentam como mio-cardiopatia dilatada , com insuficiência cardíaca e problemas de rítimo e condução elétrica ao ECG.  Estruturalmente encontramos áreas de infiltrados nos cardio-miocitos que são acompanhadas de fibroses.

                A insuficiência cardíaca é de maneira geral causada por hipossistolia, ou seja, a disfunção sistólica. Fenômenos trombo ebolíticos são geralmente comuns e podem estar presente alcançando diversos órgãos. Se tratando das alterações elétricas cardíacas encontramos uma ampla possibiidade de apresentações. São comuns as extra-sístoles ventriculares monomórficas ou polimórficas isoladas ou pareadas, Bloqueios completos do ramo direito, Hemi bloqueio anterior esquerdo, alterações da doença do nó sinusal, fibrilações atriais e taquicardias ventriculares (não sustentadas ou sustentadas). A associação de Hemi bloqueio anterior esquerdo e bloqueio completo do ramo direito estamos diante de um quandro altamente sugestivo para Chagas.  À ecocardiográfia o coração apresenta áreas hipocinéticas e acinéticas.


Caso Clínico

                Identificação:  E. S. L., Masculino 34 anos, Casado, Natural de Russas (área rural), mora desde os 15 anos em Limoeiro. Motorista. Escolaridade até a Oitava série.

                Queixa principal: “Coração acelerado”

                HDA: Paciente previamente Hígido, quando no dia 19/10/2015 acordou às 3 da manha com episódio de palpitação, acompanhada de dispneia, vômitos e febre (não sabe mensurar). Sem dor precordial ou sincope. A Palpitação durou mais de 3 horas e às 6 horas da manha paciente procurou atendimento médico em Limoeiro aonde foi  diagnosticado com “Coração acelerado” (sic), sendo então encaminhado de urgência para o Hospital de Messejana (Hospital de referência em doenças em cardiologia situado na cidade de Fortaleza). Chegou em Messejana estável com os seguintes achados : Fr:20, BPM: 110, Pa: 110 x 90, RC regular, 2T, S/S. MVU , SRA. Bom estado geral, aaa.               

Logo após chegar ao Hospital apresentou novo episódio de Palpitação, quando foi realizado ECG que evidenciou Taquicardia Ventricular monomórfica sustentada.

Foi então submetido à cardio-versão elétrica com melhora e estabilização do quadro sendo submetido então ao uso de Almiodarona, Carvedilol, captopril e espirolactona.

Submetido à Eco cardiograma foram encontrados os seguintes achados:

1. Hipocinesia e acinesia em parede ventricular esquerda.

2. Fração de ejeção de VE 29 %

3. Insuficiência mitral e tricúspide leve

 Detaca-se no ECO a hipocinesia e acinesia das paredes do Ventriculo equerdo alem de grave disfunção ventricular esquerda (fração de ejeção 29%).

 O ECG de repouso quando assintomático evidenciou extrasistole ventricular não pareada e Bloqueio completo de ramo direito.

               Paciente foi no dia seguinte transferido para o Hospital Universitário Walter Cantídio para investigação do quadro, quando foi realizado teste sorológico para Doença de chagas. O teste foi positivo sendo portanto diagnosticado com tal enfermidade.

                HPP: Sem comorbidades, nega DM, HAS, Tabagismo, nega  transfusões, álcool ou uso de qualquer oitro medicamento. A 6 meses apresentou episodio semelhante de sínncope com alto resolução. Único internamento médico anterior foi para cirurgia por trauma em mse.

                HPS: Execícíos diários de 40 minutos sem queixas cardíacas, sem animais, mora em casa de alvaneria com 3 quartos. Refere “Conhecer o Barbeiro”.

                HF:  Pai saudável, mae com HAS. Nega câncer. Avô falecido por Doença de Chagas.

                Exame físico: 60 bpm, PA: 126x88. Estado Geral bom, hipocorado uma cruz em quatro. RC regular, 2t s/s. MVU. Sem viscero megalias, RH+, Abdomen inocente

                Tratamento sugerido: Implante de CDI + tratamento farmacológico para Insuficiencia cardiaca.


Discussão:   

                O caso em questão trata-se de uma típica apresentação do mal de Chagas. Ao observarmos a história o percebemos que o paciente provavelmente adquiriu o T. Cruzi quando ainda era criança. O paciente nos relatou que quando morava na cidade de Russas (até os 15 anos de idade) ia com frequência à casa de seu avô que não por coincidência veio a falecer de Doença de Chagas, foi nessa fase também que ele relatou “conhecer o barbeiro”. Adquirir a doença de chagas na primeira infância e permanecer assintomático por décadas é a regra.

                O que chama a atenção nesse paciente é a inexistência de sintomas relacionados à Insuficiência cardíaca mesmo que a sua fração de ejeção fosse de 29 % o que o coloca no grupo dos insuficientes graves. O paciente relatava inclusive caminhadas diárias de até 40 minutos. Tais fatos apontam para o silêncio da doença de chagas cardiaca crônica. O próprio Carlos Chagas notou em suas pesquisas a quantidade anormal de pessoas que apresentavam mortes súbitas sem nenhuma queixa anterior nas regiões endêmicas. Morte súbita tal que poderia ter ocorrido com o paciente em questão caso o seu ritmo de taquicardia ventricular tivesse se convertido em atividade elétrica sem pulso, algo não raro de acontecer. Esse risco é o que justifica nesse paciente o implante de CDI, um aparelho que possui capacidade de marca passo e desfibrilador.

 

__________________________________________________________________________________________________________________________________

Fonte:

1. COSTA, M., DOENÇA DE CHAGAS: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2. Tratado de Clínica Médica. VOL. 3 / organizador: Antonio Carlos Lopes. - 2. ed. - São Paulo : Roca 2009. 3v.