Histoplasmose Clássica
Autor: Isabelle Teixeira
____________________________________________________________
Histoplasmose é uma micose sistêmica humana, podendo causar a forma cosmopolita, cujo agente etiológico é o H. capsulatum varcapsulatum, e a forma africana, pelo H. capsulatum varduboisii. Nesse artigo, falaremos sobre a Histoplasmose cosmopolita, a chamada Histoplasmose Clássica, Doença das Cavernas, Reticuloendoteliose ou Doença de Darling.
A Histoplasmose Clássica associa-se a surtos epidêmicos por visitas a lugares endêmicos e a quadros de imunossupressão, principalmente à síndrome de imunodeficiência adquirida, na qual as manifestações são graves, rapidamente progressivas e fatais.
Agente etiológico
O H. capsulatum é um fungo dimórfico (leveduriforme ou filamentoso dependendo da temperatura) e saprófita de solo.
No seu verdadeiro reservatório, o solo, em temperatura de até 35ºC, o fungo vive em forma de micélio haplóide (forma filamentosa), composto por hifas hialinas finas, septadas e ramificadas. Nessa forma morfológica, a reprodução é sexuada, por desenvolvimento de conídeos.
Já em temperatura de 37ºC, o fungo transforma-se em elementos leveduriformes unibrotantes e uninucleados, que se apresentam em colônias com aspecto úmido, liso e de cor branco-amarelada. Essas condições térmicas, o H. capsulatum encontra em seu hospedeiro mamífero, reproduzindo-se lá de forma assexuada, por brotamento.
O habitat do H. capsulatum está associado a ambientes abrigados, onde há enriquecimento do solo com excretas de morcegos e aves, uma vez que o ácido úrico inibe a microbiota competidora, favorecendo a sobrevivência deste fungo, além das condições que apresentam esses locais: temperatura, umidade e acidez adequados do solo.
Epidemiologia
A histoplasmose não é contagiosa, podendo acometer qualquer pessoa, sem preferência. A gravidade da doença é maior em indivíduos com menos de 1 ou mais de 50 anos e os imunossuprimidos.
No Brasil, há prevalência significativa da doença, com destaque para a região Sudeste, na qual a positividade para o teste de histoplasmina varia é a mais expressiva (4,6 – 93,2%).
O estado do Rio de Janeiro apresenta áreas hiperendêmicas, como o município de Angra dos Reis. Os focos de infecção associam-se a algumas fontes e atividades de risco, como mostra o quadro a seguir.
Fontes de infecção e atividades de risco mais comuns para surtos Focos de infecção de Histoplasmose |
|
FONTE |
ATIVIDADE |
Cavernas |
Espeleologia, recreação |
Galinheiros e celeiros com grande quantidade de excretas de ave |
Trabalho, recreação |
Ocos de árvores e madeira empilhada |
Corte e remoção de galhos e troncos |
Parques, jardins, florestas (mesmo quando urbanos) |
Trabalho, remoção de detritos vegetais e reformas |
Edificações antigas, principalmente quando abandonadas, sótãos com excrementos de aves e/ou morcegos |
Reformas, demolição e limpeza |
Patogenia
Os micronídeos são inalados e, ao terem contato com os macrófagos alveolares, são fagocitados. A partir disso, o fungo, por ser dimórfico, transforma-se em levedura para, então, multiplicar-se. Isso desencadeia a ativação da imunidade celular, provocando uma reação granulomatosa.
Esse foco de multiplicação no pulmão pode gerar pneumonite focal, ao atrair mais macrófagos e polimorfonucleares. Por outro lado, outros órgãos podem ser afetados, uma vez que houver disseminação hemato-linfática. Tais possíveis focos secundários são: linfonodos, baço e medula óssea.
A reação granulomatosa ocorre em indivíduos imunocompetentes dez a 18 dias após a infecção primária, enquanto em pacientes com deficiência ou imaturidade da imunidade celular, a infecção torna-se progressiva e de gravidade variável.
Manifestações Clínicas
As formas clínicas principais são:
· Infecção assintomática: acomete hospedeiros imunocompetentes; ocorrente em 95 a 99% das infecções primárias e de reinfecção.
· Histoplasmose Pulmonar Aguda: período de incubação de dez a 18 dias; febre alta, cefaléia, mialgia e astenia acompanham as manifestações respiratórias, tosse seca, dor ou opressão retroesternal, dispnéia; menos frequentemente, há associação a hepatoesplenomegalia e linfonodomegalias superficiais, exantema maculopapular difuso; geralmente, há evolução para cura espontânea.
· Histoplasmose Disseminada: presença de foco extrapulmonar e extraganglionar mediastínico de curso progressivo; acomete principalmente, de forma oportunística, imunossuprimidos, inclusive pacientes com AIDS, devendo-se dar importância a possível evolução para óbito.
Obs:deve-se suspeitar da micose em todo indivíduo imunossuprimido com febre de etiologia obscura e que resida em áreas endêmicas.
· Histoplasmose Pulmonar Crônica: acomete, principalmente, indivíduos que apresentem enfisema centrolobular ou bolhoso, nos quais esse defeito anatômico estrutural favorece a instalação do foco inicial da doença; os focos de pneumonite segmentar ocasionam fibrose pulmonar progressiva e agravamento da DPOC preexistente; quadro indistinguível da tuberculose pulmonar crônica.
Diagnóstico
O diagnóstico deve ser confirmado através de exames laboratoriais, já que a clínica não é muito característica. Deve-se dar importância aos dados epidemiológicos, que se aliam a clínica para a formulação da hipótese diagnóstica.
Em posse da suspeita, o mais comum é a confirmação pelo diagnóstico micológico, sendo obrigatório ambos: exame microscópio direto e cultura.
Tratamento
Ø Infecção assintomática: repouso e observação clínica;
Ø Histoplasmose Pulmonar Aguda: em casos de febre prolongada, Anfotricina B, na dose de 0,5 a 1 mg/kg EV em dias alternados, até alcançar dose total de 250 a 500 mg (10mg/kg para crianças);
Ø Histoplasmose Disseminada: Anfotericina B; 1mg/kg EV em dias alternados, até doses totais de 30 a 40 mg/kg;
Ø Histoplasmose Pulmonar Crônica: Anfotericina B; 1mg/kg EV em dias alternados, até doses totais de 30 a 40 mg/kg.
Obs: em casos de contra-indicação ao uso da Anfotericina B, o Itraconazol é a alternativa.
Profilaxia
Ø Limpeza regular de locais de risco;
Ø Uso de máscaras em locais suspeitos;
Ø Interdição e descontaminação de locais reconhecidamente contaminados.
Fonte: WANKE, B.; LAZÉRA, M. Histoplasmose Clássica e Africana. In: SIDRIM, J.J.C.; ROCHA M.F.G. (Ed.). Micologia Médica à Luz de Autores Contemporâneos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. p. 222-236.