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Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase
22/03/2015
Publicado por: João Victor da Silva Soares

 Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase

 

Autor: João Victor da Silva Soares


INTRODUÇÃO

         A deficiência de glicose-6-fostato desidrogenase (G6PD), uma predisposição hereditária à hemólise, é um distúrbio da homeostase de antioxidantes ligado ao cromossomo X, que é causado por mutações no gene G6PD. Em áreas onde a malária é endêmica, a deficiência de G6PD tem uma prevalência de 5% a 25%; em áreas não-endêmicas, a prevalência é de menos de 0,5%. Assim como a anemia falciforme, esta deficiência parece ter alcançado uma frequência substancial em algumas localidades, pois ela confere aos indivíduos heterozigotos para a deficiência de G6PD alguma resistência à malária, e, consequentemente, vantagens de sobrevivência.

 

PATOGENIA

             A G6PD é a primeira enzima na derivação da hexose monofosfato, uma via crítica para a geração de nicotinamida adenina dinucleotídeos fosfato (NADPH). A NADPH é necessária para a regeneração da glutationa reduzida. Dentro dos eritrócitos, a glutationa reduzida é utilizada para a destoxificação de agentes produzidos pela interação da hemoglobina com o oxigênio e por fatores exógenos como drogas, infecções e acidose metabólica.

            A maioria das deficiências de G6PD surge porque as mutações no gene G6PD ligado ao cromossomo X diminuem a atividade catalítica, a estabilidade da G6PD, ou as duas coisas. Quando a atividade da G6PD está suficientemente diminuída ou quando é deficiente, apenas uma quantidade insuficiente de NADPH fica disponível para regenerar a glutationa reduzida durante os episódios de estresse oxidativo. Isto resulta na oxidação e na agregação de proteínas intracelulares (corpos de Heinz) e na formação de eritrócitos rígidos que são prontamente hemolisados.

            Os corpos de Heinz podem lesar a membrana o suficiente para causar hemólise intravascular. Uma lesão de membrana menos grave resulta em diminuição da deformabilidade eritrocitária. À medida que os eritrócitos portadores de inclusões passam pelos cordões esplênicos, os macrófagos arrancam os corpos de Heinz. Como resultado da lesão da membrana, algumas dessas células parcialmente devoradas retêm uma forma anormal, dando a impressão de que foram mordidas. Outras células lesadas de modo menos grave revertem para a forma esferocítica pela perda da área da superfície da membrana.

         Com os alelos mais comuns de G6PD, que geram uma proteína instável, a deficiência de G6PD dentro dos eritrócitos piora à medida que os eritrócitos envelhecem. Como os eritrócitos não possuem núcleo, não pode ser sintetizado novo mRNA para G6PD; desta forma, os eritrócitos são incapazes de repor a enzima à medida que ela é degradada. Durante um episódio de exposição ao estresse oxidativo, no entanto, a hemólise inicia com os eritrócitos mais velhos e envolve progressivamente os mais jovens, dependendo da gravidade do mesmo.

 

FENÓTIPO E HISTÓRIA NATURAL

        Como um distúrbio ligado ao X, a deficiência de G6PD afeta predominantemente e mais gravemente os homens. Mulheres sintomáticas, muito raras, apresentam um desvio da inatividade do cromossomo X de maneira que o cromossomo X que carrega o alelo G6PD da doença é o cromossomo ativo nos precursores dos eritrócitos.

          Além do gênero, a gravidade da deficiência depende da mutação específica que ocorreu no gene G6PD. Em geral, a mutação comum na bacia do Mediterrâneo tende a ser mais grave do que as mutações comuns na África. Em eritrócitos de pacientes com a variante mediterrânea, a atividade da G6PD diminui a níveis insuficientes em 5 a 10 dias depois que os eritrócitos aparecem na circulação, enquanto em eritrócitos de pacientes com a variante africana, a atividade da G6PD diminui a níveis insuficientes de 50 a 60 dias após o aparecimento dessas células na circulação. Logo, a maioria dos eritrócitos está suscetível à hemólise em pacientes com formas graves da deficiência da G6PD.

            A deficiência de G6PD manifesta-se mais comumente ou como icterícia neonatal ou como anemia hemolítica aguda. O pico de incidência de icterícia neonatal ocorre durante o 2º e 3º dias de vida. A gravidade da icterícia varia de subclínica a níveis compatíveis com kernicterus; a anemia associada raramente é grave. Os episódios de anemia hemolítica aguda começam geralmente dentro de horas após um estresse oxidativo e terminam quando os eritrócitos deficientes em G6PD foram hemolisados; portanto, a gravidade da anemia associada a estes episódios hemolíticos agudos é proporcional à deficiência da G6PD e ao estresse oxidativo.

            Hemólise intravascular aguda, marcada por anemia, hemoglobinemia e hemoglobinúria, geralmente começa a 2 a 3 dias após a exposição de indivíduos com deficiência de G6PD a oxidantes. Uma vez que apenas os eritrócitos mais velhos correm risco de lise, o episódio é autolimitado, uma vez que a hemólise cessa quando apenas eritrócitos mais jovens repletos de G6PD permanecem (mesmo se a administração de um medicamento agressivo continuar).

              Infecções virais e bacterianas são os gatilhos mais comuns, pois há a presença de radicais livres derivados de oxigênio são produzidos por leucócitos ativos, porém muitas drogas e toxinas também podem propiciar a hemólise, de modo especial os antimaláricos (primaquina e cloroquina). O distúrbio favismo é o resultado da hemólise secundária à ingestão de feijões-fava por pacientes com as formas mais graves da deficiência de G6PD, como a G6PD mediterrânea; feijões-fava contêm β-glicosídeos, oxidantes de ocorrência natural.

           Além da icterícia neonatal e anemia hemolítica aguda, a deficiência de G6PD causa, mais raramente, anemia hemolítica não-esferocítica congênita ou crônica. Pacientes com a forma crônica geralmente apresentam uma deficiência grave de G6PD que causa o quadro, e uma maior suscetibilidade a infecções.A suscetibilidade a infecções aparece porque o suprimento de NADPH dentro dos granulócitos é inadequado para sustentar a explosão oxidativa necessária para destruir a bactéria fagocitada.

 

TRATAMENTO

            Deve-se suspeitar da deficiência de G6PD em pacientes de ancestralidade africana, mediterrânea ou asiática que apresentem um episódio hemolítico agudo ou icterícia neonatal. Esta deficiência é diagnosticada por meio da dosagem da atividade da G6PD nos eritrócitos; esta atividade deve ser medida apenas quando o paciente não tiver apresentado episódio hemolítico nem transfusão recentes.

            A chave para o tratamento da deficiência de G6PD é a prevenção de hemólises mediante o tratamento imediato de infecções e evitar fármacos oxidantes (por exemplo, as sulfonamidas, as sulfonas, nitrofuranos) e toxinas (como a naftalina). Embora a maioria dos pacientes com um episódio hemolítico não necessite de intervenções médicas, aqueles com anemia grave e hemólise podem precisar de reanimação e transfusões de eritrócitos.

 

RISCO DE HERANÇA

         Cada filho de uma mãe portadora de uma mutação em G6PD possui uma chance de 50% de ser afetado, e cada filha possui uma chance de 50% de ser portadora. As filhas de um pai afetado serão portadoras, mas os filhos não serão afetados, pois um pai não contribui com um cromossomo X para seus filhos. O risco que filhas portadoras têm de apresentam sintomas clinicamente significativos é baixo porque o desvio suficiente da inativação do cromossomo X é relativamente incomum.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.     NUSSBAUM, Robert L; MCILNNES, Roderick R.; WILLARD, Huntington F,; Genética Médica Thompson & Thompson. Editora Elsevier – Rio de Janeiro, 2008.

2.     KUMAR, Vinay; ABBAS, Abul K.; FAUSTO, Nelson; ASTER, Jon C. Robbins & Cotran Patologia – Bases Patológicas das Doenças. Editora Elsevier – Rio de Janeiro, 2010.