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Avaliação da Função Renal
01/03/2015
Publicado por: Ighor Magalhães de Carvalho


Avaliação da Função Renal

Autor: Ighor Magalhães de Carvalho


 

Introdução
Os rins tem função essencial para a homeostase do corpo. Atuam como filtro de substâncias, reguladores do equilíbrio hidroeletrolítico e acidobásico e produzem hormônios, como a eritropoietina e o calcitriol.
A função de filtro corresponde à capacidade de excretar substâncias tóxicas para o organismo, especialmente as derivadas do metabolismo proteico, as quais contém nitrogênio em sua composição e são chamadas de “escórias nitrogenadas”. O aumento das “escórias nitrogendas” (azotemia) é detectado pela elevação de ureia e creatinina no sangue e o seu acúmulo em grandes quantidades tem forte participação no desenvolvimento da síndrome urêmica, que compreende os sinais e sintomas resultantes de injúria renal grave.

Taxa de Filtração
A taxa de filtração glomerular é o parâmetro que quantifica a função renal. Os glomérulos filtram aproximadamente 170 litros de plasma por dia, variando com idade, sexo e tamanho. 168 litros são reabsorvidos nos túbulos e 2 litros são eliminados como urina. Algumas substâncias, além de filtradas no glomérulo, ainda podem ser eliminadas na urina pelo processo de secreção tubular.
Estima-se a função excretória renal por meio da quantificação da filtração glomerular. Quando a taxa de filtração glomerular(TFG) é menor que 15-30ml/min, a concentração de ureia e creatinina está acima de 120mg/dl e 4,0mg/dl, respectivamente, em um homem de 40 anos, pesando 70 kgs.  Dada a relação entre a TFG e a concentração de ureia e creatinina no sangue, essas substâncias constituem-se exemplos de métodos utilizados para estimar a função renal, bem como o clearence de creatinina e de inulina.
A ureia é formada no fígado a partir da molécula de amônia (NH3)-derivada do metabolismo proteico-, e eliminada quase exclusivamente pelo rim. O seu valor sérico normal é de 20-40 mg/dl e eleva-se acima dos valores de referência quando a TFG está menor que 50ml/min. Em níveis séricos maiores que 380mg/dl a ureia afeta o TGI(náuseas e vômitos) e causa disfunção plaquetária. Embora seja de fácil dosagem plasmática e tenha eliminação essencialmente renal, a ureia não é considerada um bom método para avaliar a função renal, pois diversas condições não renais podem interferir em seus níveis. Por exemplo, 40-50% da ureia filtrada é reabsorvida nos túbulos, por conseguinte condições que aumentam a reabsorção tubular (ex: hipovolemia) aumentam os níveis séricos de ureia desproporcionalmente à queda na TFG. Por outro lado, os níveis séricos de ureia podem estar diminuídos na desnutrição e na insuficiência hepática.
A partir da creatina, o tecido muscular produz a creatinina, substância atóxica cujos níveis séricos são utilizados para estimar a função renal. Ao contrário da ureia, não é reabsorvida nos túbulos e sua produção diária é relativamente constante. Os níveis normais da creatinina plasmática dependem da massa muscular e da ingesta de carne, e são fisiologicamente mais elevados em homens negros de grande massa muscular e que ingerem muita carne. Em contrapartida, idosos, desnutridos e vegetarianos apresentam redução fisiológica da creatinina basal. O valor sérico normal para homens é <1,5mg/dl e <1,3mg/dl para mulheres. Uma vez que o nível plasmático de creatinina é inversamente proporcional à TFG, sendo necessária uma queda acentuada da TFG para que a creatinina aumente acima dos valores de referência, ou seja, os estágios iniciais da disfunção renal podem não ser detectados por meio da dosagem da creatinina plasmática, o que se constitui uma grande desvantagem desse método, pois se perde a oportunidade de instituir terapias, como os iECA e BRA, que retardam a progressão da doença renal crônica.
Drogas como a penicilina e a cimetidina, uma vez que competem pela secreção no túbulo proximal, podem aumentar a creatinina plasmática sem que haja queda na TFG. O acetoacetato presente na cetoacidose diabética interfere com os ensaios de mensuração e resulta em aumento falso dos níveis de creatinina. Na rabdomiólise, em decorrência da liberação de creatinina pelo músculo lesado, os seus níveis séricos podem estar desproporcionalmente altos em comparação ao grau de injúria renal.
Por definição, o clearence é o volume de plasma que fica “limpo” de uma substância em intervalo de tempo. A substância ideal para avaliar o clearence deve ser totalmente filtrada, não sofrer reabsorção ou secreção tubular e ter concentração sanguínea constante. Como parte da ureia é reabsorvida nos túbulos, a quantidade de plasma “limpo” é menor que a TFG, pois a parte reabsorvida retorna ao plasma. Diferente da ureia, a creatinina não é reabsorvida, ou seja, toda a creatinina filtrada é excretada na urina e o plasma fica “limpo”. Vale ressaltar que 10-15% da creatinina é secretada nos túbulos, superestimando discretamente a TFG. O ClCr é o exame mais utilizado para o diagnóstico do estágio inicial da doença renal, especialmente quando ainda não há azotemia.

Fórmulas
Duas fórmulas matemáticas são amplamente utilizadas para estimar o ClCr. A mais simples de calcular é a de Cockcroft-Gault, na qual ClCr = (140- Idade)xPeso/ 72xCr pl, se mulher, multiplica o resultado por 0,85. O estudo MDRD é bastante utilizado nos EUA, entretanto tem aplicabilidade questionada no Brasil por considerar o parâmetro raça. Constitui-se essencial conhecer as limitações dessas fórmulas, por exemplo, em pacientes obesos a TFG pode ser superestimada pela fórmula de Cockcroft-Gault, já que o alto peso é essencialmente por tecido adiposo e não massa muscular.MDRD subestima a TFG no idoso.  Outra observação importante é que essas fórmulas NÃO devem ser usadas em caso de injúria renal aguda.
A inulina possui todas as características de uma substância ideal para avaliar o clearence entretanto, não possui produção endógena, tem alto custo e a técnina para realização do Cl Inulina é bastante complexa, o que restringe seu uso a pesquisas.


Referência:

RIELLA, M.C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos. 5 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010