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Sedação paliativa
18/02/2015
Publicado por: Luis Fernando Johnston Costa

Definição

Sedação paliativa é a administração deliberada de fármacos em doses e combinações necessárias para reduzir o nível de consciência, com o consentimento do paciente ou de seu responsável, e possui o objetivo de aliviar adequadamente um ou mais sintomas refratários ao tratamento específico em pacientes com doença avançada terminal. Considera-se também como uma forma de sedação primária, que pode ser contínua ou intermitente, superficial ou profunda.

O termo “sedação terminal” foi muito utilizado no passado como sinônimo de sedação paliativa, contudo, este termo vem sendo abandonado em função do sentido da palavra “terminal”, que pode levar a interpretação de que o objetivo da sedação seja “terminar” a vida. É importante reafirmar a diferença entre eutanásia e sedação paliativa. Eutanásia tem por objetivo pôr fim à vida, justificada pelo sofrimento.

Um princípio aceito por bioéticos e especialistas em medicina legal é o príncipio do duplo-efeito, que justifica o uso de várias classes de fármacos, como os opioides, mesmo que as doses necessárias para que o paciente se sinta confortável impliquem em risco não pretendido, mas previsível, para o doente. A importância em manter o doente confortável no fim da vida é a responsabilidade mais importante do médico e justifica os riscos das medicações necessárias para obter este conforto.

A administração de uma sedação paliativa não significa necessariamente supressão permanente do nível de consciência, já que seu objetivo é proporcionar conforto através do controle do sintoma. Assim, o nível de sedação deverá ser titulado em função da necessidade de cada paciente. A decisão para sedar nunca é uma decisão fácil. Em série publicada por Porta et al., 45% dos pacientes participou de alguma forma no processo de tomada de decisão e em 98% dos casos, a família participou da decisão para iniciar a sedação terminal.


Sintomas refratários

O Comitê de Ética da Sociedade Espanhola de Cuidados Paliativos (SECPAL) propôs a seguinte definição de sintoma refratário: “sintoma que não pode ser adequadamente controlado apesar dos intensos esforços para encontrar um tratamento tolerável em um prazo de tempo razoável sem que comprometa a consciência do paciente”.

São considerados critérios diagnósticos para sintoma refratário a incapacidade de obter controle adequado do sintoma a despeito de outras possíveis intervenções invasivas e não-invasivas, a morbidade aguda e crônica intolerável e a baixa probabilidade de alívio do sintoma em curto prazo. De forma ideal, a determinação da refratariedade de um sintoma deve incluir, sempre que possível, o consenso com outros membros da equipe que assistem o enfermo e/ou assessoria de outros especialistas envolvidos no cuidado.

O respeito ao consentimento e à autonomia do doente é fundamental; o desejo verbal expresso pelo paciente deve ser considerado suficiente, mas é imprescindível que tal desejo esteja adequadamente registrado no prontuário do paciente. No caso da impossibilidade ou não desejo em participar desta tomada de decisões, a família ou o cuidador principal devem ser consultados acerca dos desejos manifestados anteriormente pelo paciente; nesta situação obter o consentimento familiar torna-se especialmente importante.

Os sintomas refratários mais comumente relatados na literatura são a dor, dispneia e o delírio hiperativo. Contudo, é importante ressaltar que a partir do momento que a literatura reconhece o sofrimento psico-existencial como sintoma, este poderá se tornar passível de sedação paliativa, caso se torne sintoma refratário. Em 2004, Morita et al.83 descreveram a prevalência de sedação paliativa para alívio do sofrimento psicoexistencial em 1% dos casos. Nesta série, se considerou como principais sintomas psicoexistenciais dignos de sedação a desesperança (61%), a dependência e a inabilidade para o autocuidado (48%), o medo, a ansiedade e o pânico da morte (33%), o desejo de controlar o momento da morte (24%), o isolamento e a ausência de suporte social (22%). Antes da sedação profunda e contínua, os pacientes receberam sedação intermitente (94%), atendimento psiquiátrico, psicológico e/ou religioso (59%); dentre os pacientes com depressão, 89% recebeu antidepressivos e 35% atendimento psiquiátrico.


Considerações éticas em relação à sedação paliativa

§  Ao ser cogitada a sedação paliativa para controle de sintomas refratários, verificar as seguintes considerações éticas:

§  Presença de um sintoma reconhecido como refratário pela equipe que assiste o paciente,

§  Objetivo de redução da angústia e/ou sofrimento do paciente,

§  Redução proporcional do nível de consciência para a necessidade de alívio do sofrimento

§  Em caso de necessidade de “Sedação em Agonia”, a expectativa de horas a dias de vida.

Atualmente a bioética pode ser definida como um instrumento de reflexão e ação, baseada nos quatro princípios definidos por Beauchamp e Childress da autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça. Seguindo estes quatro princípios, a autonomia do paciente deve ser respeitada ao concordar com as prioridades e objetivos do cuidado. Sempre que possível os pacientes, junto aos familiares e cuidadores, devem medir os benefícios e os ônus do tratamento (beneficência) e avaliar os riscos e benefícios de cada decisão clínica (não-maleficência), evitando o tratamento fútil e inútil que gera sofrimento desnecessário, que não se coaduna com os objetivos de prevenção, cura, cuidado, reabilitação e alívio da dor.


Classificação da sedação

        I.               Segundo o objetivo:

• Primária: é a redução da consciência do paciente que se busca como finalidade de uma intervenção terapêutica;

 • Secundária: a redução da consciência é efeito secundário da medicação.

 

II.               Segundo a temporalidade:

• Intermitente: permite períodos de alerta do paciente;

• Contínua: a redução do nível de consciência é de forma permanente.

 

III.              Segundo a intensidade:

• Superficial: é aquela que permite a comunicação do paciente (verbal ou não verbal);

• Profunda: é aquela que mantém o paciente em estado de inconsciência.


Fármacos utilizados em sedação paliativa

Os fármacos ideais para uso em sedação paliativa devem apresentar ação rápida, fácil titulação e mínimos efeitos colaterais. A exposição prévia ao uso de opioides, a eventual desenvolvimento de tolerância ao mesmo, idade do paciente, história prévia de abuso de drogas e álcool, e comorbidades associadas são aspectos relevantes para a escolha dos fármacos a serem utilizados na sedação paliativa.

Midazolam IV ou SC

Quando usar: dor, dispneia, delírio agitado, sofrimento psíquico

Dose de indução: bolus de 2,5-5mg (5-10mg se o paciente utiliza benzodiazepínicos)

Dose inicial: 0,42-0,8mg/h

Dose de resgaste: 2,5-5mg  (5-10mg se o paciente utiliza benzodiazepínicos)

Dose máxima: 20mg/h


Clorpromazina IV, SC ou VO

Quando usar: delírio como sintoma predominante

Dose: 12,5 – 50mg a cada 4-12 horas


Levomepromazina IV (infusão contínua), SC, VO

Quando usar: delírio como sintoma predominante

Dose de indução em bolus:  12,5-25mg

Dose de resgate em bolus: 12,5mg

Dose máxima: 300mg/dia


Haloperidol IV, SC

Quando usar: delírio

Dose: 2,5-5mg a cada 12 horas

Dose máxima: 5-10mg/dia

 


• Cada paciente deve receber o sedativo e dose adequados para paliar o seu sintoma refratário específico; o objetivo da sedação paliativa é, primariamente, sedar o sintoma refratário e não o paciente;

• Não utilizar meperidina; a meperidina não deve ser usada para tratamento de dor aguda e muito menos para a dor crônica, pois causa vício. O desenvolvimento de tolerância é muito rápido, podendo ocorrer mesmo com o uso de dose única.

• Sempre que possível, iniciar com a menor dose de sedativo (sedação leve);

• Os opioides são medicações primariamente analgésicas, e não sedativas. A única exceção a essa regra é a associação morfina com midazolam para sedação paliativa da dispneia refratária;

• Para agitação, por efeito paradoxal ou não do midazolam, deve-se associar um neuroléptico (haloperidol ou clorpromazina) à sedação;

• Em delírio agitado refratário, o sedativo inicial deve ser um neuroléptico em doses progressivas. Somente associar o midazolam nos casos de sedação difícil.


Fonte

Manual de Cuidados Paliativos -  Associação Nacional de Cuidados Paliativos - 2ª edição