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Dor neuropática e câncer
18/02/2015
Publicado por: Luis Fernando Johnston Costa


Introdução

O termo dor neuropática refere-se a dor que surge como consequência direta de doenças ou de lesão afetando o sistema somatossensitivo. Esta síndrome é de difícil manuseio clínico e um grande desafio para a equipe de saúde. A prevalência de dor neuropática no câncer está em torno de 9% a 31%, podendo chegar a 36% a de componente mistos, neuropático e inflamatório.

A dor neuropática pode ser decorrente da compressão do nervo, da infiltração do tumor ou secundária a alterações neuronais relacionadas à progressão da doença ou da resposta inflamatória. Isso causa mudança do pH (acidose tissular) e liberação de várias substâncias, incluindo as citocinas ou quimiocinas que ativam o nervo.  Além disso, os pacientes debilitados estão mais vulneráveis a infecção por fungos, bactérias ou a reativação de viroses (Herpes Zoster) que podem provocar lesão do nervo ou aumentar a excitabilidade nervosa. Ainda, a dor neuropática decorrente do tratamento do câncer (cirurgia, quimioterapia, radioterapia) possui frequência em torno de 19%.


Tratamento da dor neuropática

Alguns critérios são fundamentais para definir o tratamento correto da dor neuropática:

• O diagnóstico acurado de dor neuropática.

• Identificar e tratar doenças associadas que podem contribuir para apresentação dos sintomas clínicos da dor neuropática.

• Reconhecer outras doenças que frequentemente complicam o curso clínico da dor neuropática, como depressão, ansiedade, distúrbio do sono.

• Intensificar a relação médico-paciente, esclarecendo sobre a doença, expectativas de resultado e efeitos colaterais.

• Orientar sobre as técnicas não-farmacológicas, incluindo redução do estresse, melhora do sono e terapia física.

• Compreender diferenças nos efeitos farmacodinâmicos dos agentes;

• Avaliar a influência da cultura (hábito de exercício, dieta), do uso de álcool ou fumo, da doença associada (obesidade, doença metabólica, insuficiência renal ou hepática) nos resultados do tratamento.

Além dessas etapas, é importante avaliar as contra-indicações em determinadas doenças ou a possibilidade do agente escolhido ser também eficaz no tratamento de depressão, ansiedade ou insônia. O tratamento da dor neuropática requer o emprego de fármacos que reduzam a hiperexcitabilidade neuronal através das seguintes ações: bloqueio de canais de sódio e de cálcio; aumento da transmissão gabaérgica; inibição da liberação do glutamato; inibição da formação do óxido nítrico e aumento da ação serotoninérgica. Podemos, então, sintetizar o tratamento da dor neuropática:

1.      Fármacos de primeira linha: antidepressivo tricíclico (ADT), gabapentina e pregabalina. A pregabalina é 2,5 vezes mais potente que a gabapentina, possui perfil farmacocinético e farmacodinâmico favorável, é mais fácil de usar e o paciente adere melhor ao tratamento. Ambos devem ser utilizados com cautela na insuficiência renal. O médico deve esperar 2 a 8 semanas para obter resposta ao tratamento, nesse momento, havendo dor intensa, os opioides deve ser utilizado por 1 a 2 semanas em pacientes com dor neuropática sem neoplasia. O TCA pode ser interessante na insuficiência renal (metabolização hepática sem excreção renal). Preferencialmente utilizar, principalmente em idosos, nortriptilina e desipramina, ao invés de amitriptilina ou imipramina. Alguns autores relataram que em 70% dos pacientes com câncer e dor neuropática a terapia por via oral foi suficiente para tratar a dor. Por outro lado, 30 % dos pacientes necessitaram bloqueio de nervo ou bomba de infusão intratecal para alívio completo da dor.


2.      Fármacos de segunda linha: duloxetina e venlafexina. Menor efeito anticolinérgico e risco cardiovascular. Pode ser utilizado duloxetina na neuropatia diabética ou adesivo de lidocaína na neuralgia pós-herpética. A duloxetina está contraindicada na insuficiência renal ou hepática. Sonolência, náusea, tontura, fadiga, insônia, dor de cabeça e disfunção sexual são efeitos colaterais mais utilizados. Oxicodona e tramadol também podem ser utilizados, com atenção ao risco de tolerância, adição e abuso.


3.      Fármacos de terceira linha: carbamazepina (CBZ), lamotrigina, oxcarbazepina, topiramato, valproate, bupropriona, citalopram, paroxetina, antagonista de receptor NMDA, mexiletina e capsaicina tópica não devem ser utilizados na prática clínica visto que não há evidência racional na literatura. Inúmeras são as técnicas operatórias para o tratamento da dor, que inclui a neuromodulação (estimulação da medula espinal) e as técnicas neuroablativas (lesão de zona de entrada de raiz, rizotomias de nervos sensitivos e espinais). As técnicas neuroablativas, entretanto, não são sempre eficazes e podem provocar uma piora da dor à longo prazo. A estimulação do córtex motor modula a transmissão da dor, através das fibras de grosso calibre e, se bem indicada, pode ocasionar bons resultados. O emprego de recursos físicos (estimulação elétrica transcutânea ou transcraniana, termoterapia), de terapia manual e de acupuntura, em síndromes dolorosas específicas, embora com eficácia discutida na literatura, pode ser utilizado como tratamento complementar, principalmente se houver dor miofascial associada.


Fonte

II Consenso Nacional de Dor Oncológica. -1. ed. -- São Paulo : EPM - Editora de Projetos

Manual de Cuidados Paliativos -  Associação Nacional de Cuidados Paliativos - 2ª edição