Dor abdominal
Autor: Isabelle Teixeira
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Por vezes, a interpretação adequada de um quadro de dor abdominal constitui um desafio, principalmente se referir-se à dor abdominal aguda, uma vez que a terapia necessária pode demandar um procedimento urgente. Em tais casos, a avaliação deve ser precisa e rápida, o que exige anamnese e exames físicos bem executados.
Abordagem ao paciente
Nos casos de dor abdominal aguda, o diagnóstico é rápido e torna desnecessária a abordagem pausada e tranquila. O extremo dessa abordagem é o rápido encaminhamento para cirurgia, o que é sempre indicado em casos de hemorragia intra-abdominal.
Já em dores crônicas, a anamnese deve ser sistemática e cuidadosamente detalhada. Portanto, deve-se valorar:
· Localização da dor;
· Sequência cronológica de eventos n historia do paciente;
· História menstrual em pacientes mulheres;
· Uso de narcóticos.
O exame físico também se mostra importante, constituindo-se de inspeção (de fácies, posição no leito, atividade respiratória), ausculta, percussão e palpação, nessa ordem. Na palpação, destaque para a importância de exame pélvico e retal e a desnecessária execução do sinal de Blumberg.
Os exames complementares também merecem importância, destacando-se o exame de urina, radiografias simples, ultra-sonografia, TC e laparoscopia.
Alguns mecanismos da dor de origem abdominal
Inflamação do peritônio parietal
· Dor bem localizada, de caráter constante e incômodo;
· Dor agravada por compressão ou alterações na tensão do peritônio;
· Paciente permanece quieto, preferindo evitar movimentação;
· Presença de espasmo reflexo tônico da musculatura abdominal no segmento corporal referido.
Obstrução das vísceras ocas
· Dor em cólica comumente periumbilical ou supraumbilical e mal localizada;
· Paciente pode se contorcer incessantemente.
OBS: a ausência da caracterização da dor em cólica não deve induzir ao erro, pois a distensão de vísceras ocas pode gerar dor constante com exacerbações apenas eventuais.
Observe a diferenciação da dor em distensões de vísceras diferentes:
· Intestino delgado: dor mais intensa em comparação à distensão colônica;
· Intestino grosso: dor menos intensa, localizada frequentemente na área infraumbilical;
· Vesícula biliar: dor no quadrante superior direito, com irradiação para a região posterior direita do tórax ou para a ponta da escápula direita;
· Ducto colédoco: dor no epigástrio, com irradiação para a parte superior da lombar;
· Ductos pancreáticos: dor no epigástrio, com irradiação para a parte superior da lombar, sendo frequentemente acentuada em decúbito e aliviada em posição ereta;
· Ureter: dor no flanco, que pode se estender ao mesmo lado do abdome ou para a genitália.
OBS: É comum que tais manifestações clínicas apresentem variações.
Distúrbios vasculares
Sintomas dos casos mais freqüentes:
· Oclusão da artéria mesentérica superior: ausência de dor à palpação e rigidez na presença de dor difusa e contínua;
· Aneurisma da aorta abdominal: dor abdominal com irradiação para a região sacra, o flanco ou a genitália.
A intensidade da dor pode ser branda durante 2 ou 3 dias antes do aparecimento de colapso vascular ou de achados de inflamação peritonial. Esse desconforto inicial é decorrente de hiperperistalse.
Parede abdominal
· Dor constante e incômoda;
· Presença de espasmo muscular;
· Agravamento do desconforto com movimento, postura ereta prolongada e compressão.
Dor referida nas doenças abdominais
A decisão final da origem da dor abdominal pode requerer observação deliberada e planejada do paciente por várias horas, com a execução de repetidos exames físicos para que, dessa forma, chegue-se a um diagnóstico ou à sugestão de exames apropriados.
É importante considerarmos: em todo paciente com dor abdominal, deve-se considerar a possibilidade de doença intratorácica, sobretudo quando a dor localiza-se na porção superior do abdome.
Doenças intratorácicas que mais frequentemente simulam emergências abdominais:
· Infarto miocárdico;
· Infarto pulmonar;
· Pneumonia;
· Pericardite;
· Doença esofágica.
Dor referida de origem torácica
Em comparação com os sinais e sintomas observados em doenças intra-abominais:
· Presença de imobilização do hemitórax afetado;
· Retardo respiratório e diminuição da excursão mais acentuados;
· Diminuição do espasmo muscular abdominal aparente produzido pela dor referida durante a inspiração;
· Ausência de acentuação da dor durante palpação;
Dor referida de origem na coluna vertebral
Habitualmente, envolve compressão ou irritação de raízes nervosas.
Em comparação com os sinais e sintomas observados em doenças intra-abominais:
· Intensificação da dor por movimentos como tosse, espirro ou um esforço;
· Presença de hiperestesia nos dermátomos envolvidos.
Dor referida de origem nos testículos ou vesículas seminais
Em comparação com os sinais e sintomas observados em doenças intra-abominais:
· Acentuação da dor com mais leve compressão desses órgãos.
Crises abdominais metabólicas
Toda vez que a dor abdominal for obscura, deve-se considerar uma origem metabólica.
Associação de acometimentos metabólicos a dores abdominais:
· Hiperlipidemia: acompanhada de processos abdominais como pancreatite;
· Saturninsmo: hiperperistaltismo intenso;
· Porfiria: hiperperistaltismo intenso;
· Diabetes: dor inespecífica;
· Envenenamento por aranha viúva-negra: rigidez de músculos abdominais e dorsais.
Causas neurogênicas
Doenças de origem neurológica mais comumente associadas a dores abdominais:
Herpes-zoster
· Dor lacinante que aparece e desaparece;
· Ausência de rigidez muscular e de acometimento da respiração;
· Ausência de relação da dor com a ingestão de alimentos;
· Ausência de distensão abdominal;
· Presença de espasmo muscular intenso;
· Hiperestemia;
· Agravação da dor com movimento da coluna vertebral
Causalgia
· Dor em queimação e limitada à distribuição de determinado nervo periférico;
· Estímulos normais como toque ou mudança de temperatura causam a dor em questão;
· Ausência de rigidez muscular e de acometimento da respiração;
· Ausência de relação da dor com a ingestão de alimentos;
· Presença de distensão do abdome.
Síndrome do intestino irritável
· Dor abdominal com variações de tipo e localização;
· Episódios de dor abdominal muitas vezes são desencadeados por estresse;
· Náuseas e vômitos são raros;
· Alteração dos hábitos alimentares.
Outras causas neurológicas:
· Tabes dorsalis;
· Radiculite por infecção ou por artrite;
· Compressão medular ou de raiz nervosa.
Bibliografia: Harrison Medicina Interna, Vol. 1 - Fauci, Braunwald, Kasper, Hauser, Longo, Jameson, Loscalzo; Editora Mc Graw Hill; 17a edição