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SuicÃdio e transtorno bipolar
31/07/2013
Publicado por: Diego A. H. Ortega dos Santos
Suicídio e transtorno bipolar
Introdução
O suicídio efetivado cursa em 100% dos casos com algum tipo de transtorno psiquiátrico – pode-se, inclusive, compreender o suicídio como uma complicação de algum desses transtornos. No Brasil as taxas são relativamente baixas: apenas 4,41/100.000 habitantes comete suicídio, número ínfimo se comparado com o de países desenvolvidos ou alguns casos peculiares (na Rússia o índice chega a 40/100.000). Não obstante foi uma taxa que cresceu na ordem de 21% nos últimos 20 anos e que em números absolutos coloca o Brasil entre os 10 países com mais mortes por suicídio: seis mil por ano.
O paciente com transtorno bipolar apresenta 28 vezes mais chances de cometer suicídio (índice de 390/100.000 em média). 10 a 15% dos pacientes com o transtorno morrem em função disso, e até 55% já fez ao menos uma tentativa. Trata-se, em suma, de uma real preocupação no manejo do paciente bipolar e também um fator adicional que alça a doença à categoria de problema de saúde pública.
Etiologia
Centenas de estudos tentam linkar achados genéticos, transtorno bipolar e o comportamento suicida. Há, entretanto, o viés comportamental em função do impacto de ter um familiar com morte por suicídio, sem mencionar todos os entraves dos estudos. O que há de mais concreto é a presença do alelo S na região promotora do gene 5-HTT (responsável pelo transportador de serotonina) sendo associada a maior comportamento suicida.
Acredita-se que além da causa genética a teoria estresse-diátese deve ser a mais bem analisada, pois há chances de intervenções clínicas. Essa teoria propõe que o suicídio nesses pacientes ocorre pela combinação de um estresse – luto, antecipação ao luto ou a situações adversas, intoxicação por álcool ou outros depressores e intoxicação por alteradores do humor como LSD – e de uma diátese (isto é, de uma vulnerabilidade idiossincrática preexistente) como personalidade impulsiva, agressiva, pessimista, ou desesperança e falta de sensação de utilidade, abuso físico ou sexual na infância ou abuso crônico de substâncias. É no campo da diátese que alguma prevenção pode ser feita ao se trabalhar essas questões: é daí que se tira que os índices de sucesso terapêutico no paciente bipolar são muito maiores quando alguma psicoterapia está presente.
Clínica: os fatores de risco
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Sexo masculino
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História familiar de suicídio
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Presença de co-morbidades, psiquiátricas ou não, sendo o abuso de álcool a mais comum
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Tentativas prévias de suicídio (estudos mostram que elevam em 37 vezes o risco de suicídio completo)
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Diáteses relevantes, a agressividade e o pessimismo como os mais importantes
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Alta hospitalar recente
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Episódios depressivos intensos de acordo com a subjetividade do paciente
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A presença de psicoses, entretanto, não é um indicador perfeito para risco aumentado de suicídio
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Os pacientes com transtornos mistos (em todos os espectros propostos pelo DSM-IV) são os que mais se relacionam com o suicídio completo. Pensa-se que o afeto e a cognição depressivas, ao se combinarem com o acréscimo de energia, impulsividade e irritabilidade, são o gatilho para o comportamento suicida. Tanto é que o suicídio em fase maníaca é relativamente incomum, variando de 2 a 11% dos casos
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É importante salientar que o traço de personalidade ‘impulsividade’ é sim relevante, mas não quando isolado: é comum ganhar importância quando vinculado ao comportamento agressivo e a co-morbidades como o uso de substâncias de abuso
Tratamento
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Antidepressivos: por mais que sejam extremamente comuns nas prescrições médicas visando combater o comportamento suicida, estudos rigorosos sugerem que não há ganho terapêutico nesse sentido nem do paciente depressivo unipolar nem no bipolar. No bipolar, inclusive, alguns podem gerar fatores de risco: a insônia, a irritabilidade e a agitação que pode advir desses medicamentos pode potencializar atos agressivos e impulsivos. É preciso, então, cautela.
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Lítio: é, ainda, o padrão-ouro em todos os estágios do transtorno bipolar. É, a rigor, o único estabilizador do humor com eficácia garantida. Certos estudos falam em redução de 82% do risco de suicídio completo, e que talvez haja até mesmo um efeito dose-resposta proporcionado. As críticas a tais estudos reclamam que o paciente que aceita e cumpre o tratamento com lítio – longo e rigoroso – já são sujeitos com risco diminuído para suicídio, o que seria um viés de seleção.
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Antipsicóticos: por mais que amplamente utilizados na fase maníaca, não apresentam indicação para prevenir suicídio no transtorno bipolar. Atualmente são indicados apenas na esquizofrenia.
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Eletroconvulsoterapia: é o tratamento de escolha em emergências com risco iminente de suicídio, especialmente em estados depressivos graves. Não há, entretanto, nenhuma indicação no tratamento de longo prazo.
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Intervenções psicossociais: não há estudos comprovando a redução de risco de suicídio em nenhuma espécie de intervenção do gênero. São ainda assim indicadas por, teoricamente, facilitarem a adesão ao tratamento, a ida ao clínico e por melhorarem o prognóstico geral do paciente.
Fonte: Transtorno Bipolar, teoria e clínica, 1 ed; Kapczinski e Quevedo et al