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Apendicite Aguda
07/05/2013
Publicado por: Caio Mayrink

Autor: Daniel Machado

 

Incidência e epidemiologia

A incidência máxima de apendicite aguda ocorre na segunda e na terceira décadas de vida. Embora a doença possa ser encontrada nos extremos da vida, é relativamente rara nos extremos etários. Homens e mulheres são igualmente afetados, exceto entre a puberdade e os 25 anos de idade, quando os homens predominam (3:2). A perfuração é relativamente mais comum em lactentes e idosos, faixas etárias em que as taxas de mortalidade são mais altas. A taxa de mortalidade bem como a incidência vem diminuindo na Europa e nos EUA ao longo dos anos. Alguns fatores como alteração nos hábitos alimentares, flora intestinal alterada e melhor nutrição foram utilizados para explicar a redução desses índices, mas nenhum foi comprovado.

 

Patogenia

A característica patogênica primária sempre foi considerada a obstrução luminal. Embora se possa identificar obstrução em 30% a 40% dos casos, estudos recentes mostraram que na maioria deles a ulceração é o evento inicial. A causa da ulceração não é conhecida, embora tenha sido postulada uma etiologia virótica. Foi sugerido que Yersinia causasse a doença, umas vez que foram constatados altos títulos de fixação de complemento nos casos de apendicite comprovada por cirurgia. Não está claro se a reação inflamatória simultânea à ulceração é suficiente para obstruir a pequena luz apendicular, mesmo que transitoriamente. A obstrução quando presente é mais comumente causada por um fecalito, resultante de acúmulo e do espessamento do material fecal em torno de fibras vegetais. Folículos linfóides associados a infecções viróticas, bário espessado, vermes e tumores também obstruem a luz. A secreção de muco distende o órgão, que tem capacidade de 0,1 a 0,2 mL, e as pressões luminais sobem até 60 cmH2O. As bactérias luminais multiplicam-se e invadem a parede apendicular à medida que o ingurgitamento venoso e o subseqüente comprometimento arterial resultam das altas pressões intraluminais. Por fim, ocorrem gangrena e perfuração. Se a evolução do processo for lenta, os órgãos adjacentes, como a porção terminal do íleo, o ceco, o omento, “bloqueiam” a área apendicular, de forma que ocorre um abcesso localizado, enquanto a progressão rápida do comprometimento arterial causa perfuração com acesso livre à cavidade peritoneal. A ruptura subseqüente dos abcessos apendiculares primários provoca fístulas entre o apêndice e a bexiga, intestino delgado, sigmóide ou ceco.

 

Manifestações clínicas

Na grande maioria dos casos o sintoma inicial consiste em dor abdominal do tipo visceral, resultante das contrações apendiculares ou de distensão da luz. Em geral, é mal localizada na região periumbilical ou epigástrica. Com freqüência, ocorre urgência associada à defecação ou à eliminação de gases, que não aliviam o desconforto. À medida que a inflamação dissemina-se para as superfícies peritoneais parietais, a dor torna-se somática, constante e mais grave, agravada pelo movimento ou tosse e, em geral, localizada na fossa ilíaca direita. Anorexia é tão freqüente que a fome deve levantar a suspeita de diagnóstico de apendicite aguda. Náuseas e vômitos ocorrem em 50% a 60% dos casos, mas raramente o vômito é abundante e prolongado. Frequência urinária e disúria ocorrem se o apêndice estiver adjacente à bexiga. A sequência típica de sinais e sintomas (dor periumbilical mal localizada seguida por náuseas e vômitos com subseqüente desvio da dor para a fossa ilíaca direita) ocorre em apenas 50% a 60% dos casos. Os achados físicos variam com a ocasião após o início da doença e de acordo com a localização do apêndice, que pode estar situado profundamente no fundo-de-saco pélvico; na fossa ilíaca direita em qualquer relação com o peritônio, o ceco e o intestino delgado; no hipocôndrio direito (em especial na gestação); ou até mesmo na fossa ilíaca esquerda. O diagnóstico não pode ser estabelecido, a menos que possa ser evocada dor a palpação. Embora ocasionalmente não haja dor à palpação no estágio visceral inicial da doença, esta finalmente desenvolve-se e é encontrada em qualquer localização correspondente à posição do apêndice. Dor a palpação abdominal não ocorre se houver um apêndice retrocecal ou pélvico, caso em que o único achado físico consiste em hipersensibilidade no flanco ou ao exame retal ou pélvico. Flexão do quadril direito e movimento de defesa pelo paciente são decorrentes do comprometimento peritoneal parietal. Hiperestesia da pele da fossa ilíaca direita e sinal positivo do músculo psoas ou obturador em geral são achados taridos e raramente têm utilidade diagnóstica. O exame laboratorial não estabelece o diagnóstico porque este baseia-se principalmente no quadro clínico. Embora leucocitose moderada de 10000 a 18000 seja frequente (com desvio simultâneo para células imaturas), a ausência de leucocitose não elimina a possibilidade de apendicite aguda. Leucocitose acima de 20000 deve alertar o médico para a possibilidade de perfuração. Anemia e sangue nas fezes sugerem um diagnóstico primário de carcinoma do ceco, em especial nos indivíduos idosos.

 

Diagnóstico diferencial

A lista dos diagnósticos diferenciais da apendicite aguda produziria uma enciclopédia de todas as condições que causam dor abdominal, pois a apendicite simula qualquer uma dessas doenças. As condições mais comuns descobertas à cirurgia quando a apendicite aguda é diagnosticada erroneamente são, em ordem aproximada de freqüência, linfadenite mesentérica, ausência de doença orgânica, doença inflamatória pélvica(DIP) aguda, ruptura do folículo de Graaf ou de cisto do corpo amarelo e gastroenterite aguda. Além disso, colecistite aguda, úlcera perfurada, pancreatite aguda, diverticulite aguda, obstrução intestinal por estrangulamento, cálculo ureteral e pielonefrite frequentemente apresentam dificuldades diagnósticas.

 

Tratamento

Catárticos e enemas devem ser evitados se houver suspeita de apendicite e antibióticos não devem ser administrados quando existe dúvida sobre o diagnóstico, pois eles apenas mascaram a presença ou o desenvolvimento de perfuração. O tratamento consiste em cirurgia precoce e apendicectomia assim que o paciente estiver preparado. A apendicectomia é cada vez mais realizada por laparoscopia. A única circunstância em que a cirurgia não é indicada é a presença de uma massa palpável 3 a 5 dias após o início dos sinais e sintomas.

 

Fonte: Harrison Medicina Interna – 17ª edição